domingo, 12 de fevereiro de 2012

Sala de embarque

Uma sala de embarque, três pessoas, um sentado e dois de pé, e alguma fumaça em volta.

- Não, não. Calma aí!
- O que?
- Quer dizer que você vai levar ele assim?
- Sim.
- Por que?
- Sei lá, por que eu quero.
- Ah, mas toda vez isso, por que você quer.
- Sim.
- Cansei disso. Acho que temos que criar um sistema.
- Gente. – tenta intervir.
- Shiii... Só um pouquinho.
- Um sistema?
- Sim. Um sistema. Você ta ficando com todos os bons.
- Mas esse é o nosso sistema. Os bons são meu, os maus são seu.
- Sim eu sei, mas é que você acaba sempre arranjando um jeitinho de converter os maus. Sabe como está difícil de encontrar maus, maus mesmo.
- Graças a mim.
- “graças a mim”, “graças a mim”. Eles estão vindo pra mim, na sala de embarque, aí você aparece com essa luz toda sua.
- O que é que tem minha luz.
- Pessoal. – tenta novamente.
- Ei. Da pra dar uma licença estamos tratando de um assunto sério aqui.
Silencio.
- O que é que tem minha luz?
- Sei lá, acho que você está apelando demais para os efeitos especiais.
- Ah, eu to apelando?
- É!
- Eu, euzinho, apelando, é isso mesmo que você acha?
- Sim, acho.
- Então vamos falar de apelar. Quem aqui promete balada eterna, com mulheres nuas, comida, bebida e tudo o que tem numa boa orgia?
- Pera aí isso é diferente.
- Não é diferente não.
- É sim, você também faz um monte de promessas, paraíso, paz eterna, harmonia e outros. Alias que porra é “outros”?
- Ah é umas parada aí. Alias eu não sei por que estamos discutindo isso, já ta decidido que ele é meu.
- Sou seu?
- Não, que seu.
- Porra ta difícil hoje hein.
- Na verdade não ta difícil hoje, ta difícil faz tempo. Mas é que só hoje eu falei.
- Aí filho.
- Pera aí filho não, não vem com esse papinho de filho pra cima de mim.
- Ta bom Lu, o que voce quer?
- Ei vocês estão falando de mim, como assim quer ele, não quer ele? Do que vocês estão falando?
- Fica quietinho um pouco, se morto voce é chato assim imagina quando estava vivo.
Os dois assentem com a cabeça como se concordassem com algo pela primeira vez.
- Morto, como assim morto?
- Eu quero ele.
- Não, pede outra coisa.
- Quem são vocês?
- Eu não quero outra coisa, eu quero ele.
- Onde eu estou, da onde ta saindo toda essa fumaça.
- Eu não posso te dar ele.
- Eu to morto mesmo? Eu to me sentindo tão bem.
- Que gênio hein!
- Viu, você nem gosta dele.
- Eu não gosto de nenhum. Mas preciso deles.
- Será que eu posso saber do que vocês estão falando.
- Eu tava de passagem pra conferir o trabalho, aí resolvi buscar você pessoalmente e dei de cara com o Lucifer.
- É, eu to sempre aqui presente, não apareço de vez em quando igual você, tenho que acompanhar tudo de perto.
- Lucifer? Voce é o Lucifer?
- Sim por que, algum problema?
- Não, nenhum. Nenhum mesmo.
- Já estamos de saída. – vira as costas pra sair.
- Não Deus. Calma aí. Isso é injusto.
- O que voce disse?
- Deus?
- Oi?
- É injusto sim.
- Olha, se tem uma coisa que eu não sou é injusto.
- Eu devo estar sonhando.
- Cala a boca. – falam os dois.
- Ei!
- Ah não?
- Não.
- Fala tanto de livre arbítrio pra cá, livre arbítrio pra lá, mas basta eles falarem, ou pensarem, ou escreverem uma palavrinha e pronto já estão no reino do céus, o paraiso da harmonia e outros. Aquela porra deve estar com lotação máxima.
- Ei olha o respeito.
- Desculpa, mas é que é verdade.
- Quer dizer que eu vou pro céu.
- Vai!
- Ainda não.
- Já foi resolvido. Ele vai e pronto.
- Porra não da pra conversar com você. Você se acha o rei do universo.
- E é!
Deus assente com a cabeça.
- Puxa mais o saco dele.
- Um elogio é sempre bom.
- Um elogio, mimimi...
- Ih é melhor a gente ir indo, ele começou a ficar bravinho.
- Não to ficando bravinho.
Silencio.
- Ta, eu to. Mas é por que eu não aguento mais.
- Quer trocar de lugar comigo? Voce acha que é fácil ficar ouvindo tanta reclamação?
- Não, eu sei que não ta fácil pra ninguém. Mas é que voce já é o querido. Tem credibilidade e tals. Já fez seu nome, não precisa mais ficar fazendo marketing por aí.
- Xiii... Você é quem pensa. Toda hora aparece um me difamando. Ou prometendo coisas em meu nome. Sabe como é difícil explicar esse negócio das virgens?
- Pera aí mais quem se suicida não vai pro inferno?
- Porra eu até esqueci que voce estava aí...
- É, era pra ir. Voce está escondendo algo de mim Deus?
- Não. – olha para o homem. – cala a boca. – resmunga.
- Sabia que tinha alguma coisa errada. Nunca recebi nem um homem bomba lá. Até achava estranho, mas como recebo muito terrorista nem esquentava a cabeça.
- Pois é, que loucura – olha para o pulso – já ta na minha hora. To cheio de coisa pra fazer, vamos?
- Não acredito que você estava me roubando esse tempo todo.
- Não fala assim, roubar é uma palavra muito forte.
- Roubando sim. Na cara dura. E eu aqui todo honesto com você.
- Ah eu achei que tava fazendo uma coisa boa.
- E é uma coisa boa.
- Cala-boca. – fala o Lu. – Esperava isso de qualquer um, menos de você.
- Que isso, não fala assim.
- To muito sentido.
- O que eu posso fazer pra te recompensar.
- Não sei se eu posso perdoar tão fácil assim.
- Ah para, nem foi tão grave assim, só foram uns homens bombas.
- Uns pra você que tem quem quiser.
- Falando desse jeito, ta fazendo me sentir mal.
- Mas é pra ficar mesmo. Por que achei que tínhamos um acordo.
- E temos.
- Não parece. Depois de tantas eternidades de convivência, tudo o que passamos vários fins do mundo, guerras. Você me trai desse jeito. Se eu tivesse feito isso, tudo bem, por que eu sou o Diabo, todo mundo espera isso de mim. Agora você, Deus o exemplo, o onipotente, onisciente, onipresente.
- Pisou na bola hein.
Deus só fica em silencio. Lucifer vira as costa, abre uma porta de fogo ele vai em direção a ela.
- Pera aí que eu vou com você. – grita o homem. – porra porta legal hein. Tem balada e mulher mesmo.
Lucifer assente com a cabeça os dois somem na porta.

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